17 de Setembro 2020
A segurança do doente ganhou maior relevância com a COVID-19. Opinião da enfermeira Vânia Gomes, do IPO Lisboa, no Dia Mundial da Segurança do Doente, em ano de pandemia.
A prestação de cuidados de saúde é uma atividade complexa, na qual participam ativamente muitos profissionais, de várias especialidades e em diferentes níveis, comportando riscos que podem ter sérias consequências na vida dos doentes. Garantir a segurança e a qualidade dos cuidados reduzindo a probabilidade de ocorrência de erros e reduzindo os riscos exige a todos os profissionais de saúde um permanente «estado de sentinela». Se a estas premissas acrescermos a complexidade da doença oncológica – com tratamentos que têm impacto a nível físico e psicológico nos doentes e nas suas famílias – percebemos facilmente o quão complexo e exigente é todo o processo do «cuidar».
As questões associadas à segurança do doente e à qualidade dos cuidados ganharam mais relevância com a pandemia COVID-19, que suscitou muitas e novas dúvidas e pôs a descoberto os medos e os receios de todos nós, profissionais e doentes.
O Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil (IPO Lisboa) teve que se adaptar a esta nova realidade. Como manter o nível de qualidade de cuidados a que habituámos os nossos doentes? Como garantir a continuidade dos tratamentos e manter a oferta sem comprometer em demasia os profissionais da instituição? Como ser eficientes e eficazes? Como garantir a equidade no acesso, evitar atrasos e responder às necessidades dos doentes e familiares? Estas foram alguns dos desafios com que nos deparamos.
Para encontrar respostas a esta e a muitas outras dúvidas e auxiliar à de tomada de decisão, o Conselho de Administração criou um grupo de trabalho multidisciplinar – o Gabinete de Crise para a COVID-19.
A gestão do risco inerente a todo este processo conduziu à implementação de medidas como a estandardização de processos, criação de protocolos de atuação em novas áreas, difusão de novos conhecimentos, treino individual e em equipas, capacitação para antecipação de acidentes e para reconhecer e remediar erros identificados.
São exemplos dos nossos desafios a reorganização da estrutura organizacional; a redefinição dos circuitos dos doentes programados do ambulatório e do internamento (consultas, tratamentos, cirurgias, meios complementares de diagnóstico, etc.) e dos doentes não programados (em tratamento ativo e que nos procuram por agudização da sua doença); o controlo da infeção hospitalar com ênfase na capacitação para utilização correta dos equipamentos de proteção individual nos diferentes tipos de cuidados; a elaboração de novos protocolos; a redução da circulação de doentes nos serviços e no hospital; o reajustamento das atividades clínicas; a redução da lotação dos espaços de espera; a testagem de doentes e de profissionais, o cumprimento das novas normas…
As novas medidas e a gestão do risco num hospital que procura proteger os seus sem comprometer a sua missão obrigou a fazer muitas alterações num tempo muito curto, um repto que envolveu todos os profissionais de todas as estruturas e serviços. Um reconhecimento ao Grupo de Coordenação Local do Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos Antimicrobianos do IPO Lisboa, que teve um papel fundamental neste percurso.
Ao longo destes seis meses de pandemia, o IPO Lisboa reinventou-se constantemente e soube responder às situações mais problemáticas. É certo que, por vezes, identificamos alguma resistência à mudança.
Afinal, somos um hospital com caraterísticas muito particulares, tanto na relação com os doentes e as famílias – gestos e comportamento apreciados antes da COVID-19 passaram a estar interditos – como na organização do trabalho – a segurança e a qualidade em oncologia obrigam à multidisciplinaridade.
É certo que nos confrontamos com dificuldades circunstanciais associadas à vivência da pandemia, sobretudo no início, quando parecia que tínhamos feito tudo bem e, depois, detetávamos casos pontuais de infeção por SARS-Cov-2 em doentes ou profissionais; o que obrigou a quarentenas e ausências mais prolongadas, com reflexo na dinâmica dos serviços, nos recursos, no número de camas e na capacidade de resposta.
Os profissionais foram resilientes. Os doentes e os familiares foram «parceiros» ativos. Cumprimos a nossa missão, garantindo a prestação dos cuidados e salvaguardando a segurança de todos.
«Cuidar dos outros, cuidando de nós!» é o mote da equipa de Gestão do Risco Clínico do IPO Lisboa, uma premissa que ganhou mais força com o aparecimento da COVID-19 e que vamos continuar a esforçar-nos para garantir.
Vânia Gomes
Enfermeira chefe do Serviço de Atendimento Não Programado e membro da equipa de Gestão do Risco Clínico do IPO Lisboa.